O temido dia da perícia do INSS: o que você precisa saber

Dr. Tiago Faggioni Bachur 26/10/2025

O temido dia da perícia do INSS: o que você precisa saber

(por Tiago Faggioni Bachur – Advogado e Professor especialista em Direito Previdenciário. Autor de obras jurídicas.)


Você acorda cedo, toma aquele café amargo de ansiedade, separa uma pilha de papéis e vai até a agência do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). O coração dispara.

“Será que o perito vai entender minha dor?”

“E se ele achar que estou bem?”

Essas perguntas ecoam na cabeça de milhões de brasileiros que precisam passar pela perícia médica da Previdência Social para garantir um direito básico: o benefício por incapacidade.

Pois é… A perícia médica do INSS é o momento decisivo entre o “sim” e o “não” (e pode definir o rumo de uma vida). Mas o que poucos explicam é como essa perícia realmente funciona, o que o perito avalia, o que levar e, principalmente, como não ser vítima da frieza do sistema.

  1. A perícia médica do INSS: o “tribunal da dor”

A perícia médica previdenciária é o procedimento em que o perito do INSS avalia se você está (ou não) incapacitado para o trabalho, e de que forma: temporária ou permanente.

É com base nesse laudo que o INSS concede ou nega benefícios como o auxílio por incapacidade temporária (antigo auxílio-doença), a aposentadoria por incapacidade permanente (antiga aposentadoria por invalidez) e até o Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS) para pessoas com deficiência.

Mas atenção: o perito não está ali para tratar da sua saúde, e sim para analisar se a sua doença gera incapacidade laboral.

Como explicam diversos especialistas, trata-se da “anatomia da prova”, em que cada detalhe do comportamento e da documentação pode fazer diferença no resultado.

E é justamente aí que muitos segurados tropeçam — porque não sabem o que o perito realmente quer ver.

  1. O que o perito avalia (e o que ele não quer saber)

De forma técnica, o perito do INSS observa três pilares:

  1. Diagnóstico clínico — qual é a doença (com base em laudos, exames e CID);
  2. Limitações funcionais — o que essa doença impede você de fazer;
  3. Atividade habitual — qual era o tipo de trabalho que você exercia.

Um exemplo: um pedreiro com hérnia de disco grave e limitação para carregar peso tem, em regra, incapacidade. Já um auxiliar administrativo com o mesmo problema pode, dependendo do caso, continuar apto.

O foco é sempre a relação entre a doença e o trabalho, não a gravidade da doença em si. Por isso, apenas dizer “estou com dor” não basta. É preciso demonstrar como essa dor impacta suas funções diárias e profissionais.

  1. O que levar no dia da perícia (sem erro)

Prepare-se como quem vai para uma entrevista de emprego (só que ao contrário).
Você precisa convencer o perito de que não consegue trabalhar com provas (não com discursos).

Checklist essencial:

  • Documento de identificação com foto e CPF;
  • Comprovante de agendamento;
  • Carteira de trabalho ou comprovante de atividade (para autônomos e MEIs);
  • Atestados médicos recentes, com CID, assinatura, carimbo e data;
  • Exames complementares (raios-X, ressonâncias, ultrassons, laudos psicológicos, etc.);
  • Receituários e relatórios médicos com descrição clara das limitações;
  • Declaração do empregador, se houver, sobre afastamento e função;
  • Comprovantes de tratamento contínuo (fisioterapia, medicação, etc.).

Parece óbvio, mas muitos comparecem apenas com o RG e um atestado genérico escrito “afastado por 90 dias”. Resultado: indeferimento na certa.

Como costumo alertar, o sistema é burocrático e, muitas vezes, parte da presunção de que o segurado está agindo de má-fé. Acham que todos querem “ganhar um benefício sem precisar”. E aí, o justo acaba pagando pelo pecador.

Por isso, quanto mais provas, melhor. Mas cuidado: excesso de documentos também pode atrapalhar.

Um bom exemplo: levar laudos antigos (de dois ou três anos atrás) pode levar o perito a concluir que, se você continuou trabalhando mesmo doente, há doença, mas não incapacidade.

Por outro lado, quando comparados a exames recentes, esses documentos podem mostrar agravamento do quadro — e aí, sim, ajudar.

Tudo depende de estratégia e, de preferência, da orientação de um advogado especialista em Direito Previdenciário de sua confiança.

  1. O que não fazer (e o que o perito nota sem você perceber)

O perito é treinado para observar comportamento, fala, postura, gestos e até incoerências entre o que você diz e o que faz.

Você precisa convencê-lo com verdade, não com teatro.

Assim, EVITE:

  • Exagerar nos sintomas (ele percebe);
  • Demonstrar descuido com o tratamento (pesa negativamente);
  • Levar exames velhos (mais de seis meses, perdem força);
  • Falar demais ou se irritar (o perito anota tudo);
  • Aparecer com sinais de atividade laboral recente (ex.: mecânico com graxa nas mãos);
  • Frases dramáticas como “não aguento mais trabalhar nunca mais” (soa teatral).

 Prefira: Serenidade, coerência e clareza.

O perito não é seu inimigo, mas também não é seu amigo.
Ele é o juiz da incapacidade. E como todo juiz, decide com base nas provas.

  1. E quando o INSS nega? Vem aí a perícia judicial

Se o benefício for negado na via administrativa, ainda há a via judicial — e o cenário muda completamente.

O juiz nomeia um perito judicial, médico de confiança do Poder Judiciário (e não do INSS). Essa perícia costuma ser mais detalhada e o segurado pode ser acompanhado por seu advogado previdenciarista e até por um assistente técnico (médico particular indicado pela parte).

O Código de Processo Civil garante o contraditório e a possibilidade de formular quesitos periciais (perguntas técnicas que ajudam a esclarecer pontos relevantes). Um advogado experiente sabe quais perguntas podem fazer a diferença, quando se torna necessário o esclarecimento.

E, diferentemente da esfera administrativa, há recurso, réplica, impugnação e audiência, conforme o caso.

Muitos benefícios negados no INSS acabam sendo concedidos na Justiça.
E não porque o segurado “deu sorte”, mas porque na Justiça o exame é feito com mais imparcialidade e transparência.

  1. A ironia do sistema (e a urgência da justiça)

Curioso, não?

O trabalhador paga INSS por décadas, adoece, e precisa “provar” que está doente (para o próprio sistema que prometeu protegê-lo).

É quase um teste de resistência emocional, travestido de procedimento técnico.
E quando a máquina nega, o cidadão precisa recorrer à Justiça, onde, ironicamente, muitas vezes consegue o que já deveria ter recebido lá atrás.

  1. Conclusão: não vá sozinho: leve consigo a experiência

A perícia médica é, antes de tudo, uma prova técnica e jurídica.
E como toda prova, exige estratégia, conhecimento e preparo.

Por isso, contar com um advogado especialista em Direito Previdenciário é mais do que uma escolha inteligente... É uma forma de se proteger.

Um bom profissional sabe analisar o seu caso, orientar sobre documentos, formular quesitos técnicos, acompanhar a perícia judicial e, sobretudo, traduzir a sua dor em linguagem jurídica (aquela que o perito e o juiz entendem).

No fim das contas, a perícia é um espelho: reflete o quanto você está preparado.
E, convenhamos, num jogo onde o adversário é o próprio sistema, não dá para entrar desarmado. Em caso de dúvida, procure sempre um advogado especialista de sua confiança.



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Publicado em 26.10.2025 no site Bachur Advogados (disponível em www.bachuradvogados.com.br), no Blog “Tenho Direito Doutor?” (disponível em https://bachuradvogados.com.br/blog/artigo/p/152),  no "Álbum de Dicas do Dr. Tiago Faggioni Bachur" do Facebook (disponível em https://www.facebook.com/media/set/?set=a.6599692126713770&type=3) e “Portal GCN-Sampi” na coluna “Opinião” (disponível em https://sampi.net.br/franca/categoria/id/398/tiago-bachur). 

 

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